sexta-feira, julho 29, 2005

Confissão

eu já fui homem de mulher de noite
eu já tive caso com mulher casada
eu já corri de marido traído
eu já morei em quatro estados
eu já viajei o mundo todo
eu já andei no meio de deserto
eu já estive em locais onde o perigo é apenas o menor dos males
eu já andei de noite em favela
eu já fui a terreiro de umbanda
eu já freqüentei sermão católico
eu já gozei gostando, e não gozei fingindo
eu já encantei platéias, e já fui vaiado pelas pessoas que me amam
eu já tive inimigos que me ameaçaram de morte
eu já tive amores que me provocaram ciúmes
eu já passei fome sozinho e com amigos
eu perdi um pai que se suicidou e eu tive que recolher o corpo
eu tenho amigos com AIDS
eu tive familiares que morreram gritando de câncer
eu vi tudo isso
eu passei pela vida vendo e olhando a minha dor
e a dos outros
eu senti os meus motivos e o dos outros
eu aprendi a dizer sim e não
e também a entender o talvez
eu sei o que é caminhar na neve no Central Park
e caminhar na lama em Bombaim
eu sei o que é apanhar de quinze homens
e de uma única mulher
eu comi comida francesa no Quartier Latin
e comi cachorro de um real em Porto Alegre
eu tive casa, carro e dinheiro
e também tive muitos desgostos com isso
eu tenho uma família riquíssima
e hoje não estou nada bem de grana
eu amei meus amigos, homens e mulheres
eu odiei meus inimigos, homens e mulheres
eu matei uma pessoa, eu dei a luz à outra
eu tenho um irmão com uma doença grave
eu tenho uma irmã que me faz falta
eu tenho uma mãe que não fecha comigo
eu não tenho mais um pai, mas ele não fechava comigo
eu choro sozinho de noite
eu tenho medo de não fazer o que posso
de não ter tempo de ser o que sei ser
eu tenho medo de não corresponder às pessoas que me cercam
eu tenho medo de corresponder a elas
eu tenho uma vida pela frente
e eu tenho um passado pelas costas
ambos se encontram em mim hoje
e acho que não é você que pode ou não me julgar
pode ou não me dizer o que falta
o que posso ou não fazer
acho que não tem o direito disso
acho que não tem capacidade para isso
acho que não tem experiência para isso
acho que não tem coragem para isso
não tente agir comigo como com qualquer pessoa
pois não sou, e não tenho vontade de ser
o que funciona com os outros não funcionará comigo
por trás de tudo isso que te contei
tem um príncipe meigo, carinhoso, dócil e muito infantil que, certamente, peca por ser ingênuo
e tem uma raposa venenosa, sarcástica, metódica e vingativa que não mede esforços para ferir quem magoou o príncipe
cuidado para não encontrá-los
não sei com qual deles você se encantaria mais
e não sei de qual deles você deveria ter mais medo

6 comentários:

Anônimo disse...

Fiquei um tempo sem visitar teu blog.....
Acho q voltei em boa hora...
Inspiração total!
Bjs

Anônimo disse...

Bom saber q vc ri, chora, embravece, ama, odeia, enfim, q vc de alguma forma...sente!! Me lembra muita coisa sua confissão, vc bem sabe do q estou falando!! beijos...Lua!!

Anônimo disse...

Desde q te conheci visito com frequencia o teu blog,pq te acho um ser humano com um interior lindo, e adoro os textos q vc escreve, me fazem refletir... Pq acredito q a vida é mto mais do q isso q a gente vê, e q ninguém veio ao mundo a passeio,pena q poucos sabem disso.

Anônimo disse...

Ando visitando seu blog e estou fascinada com seus textos e poemas, vc escreve de uma forma bem especial. Que bom q me convidou para entrar aqui, estou adorando, e parabéns!
abs,
Miriam Carneiro

Miguel disse...

Fico feliz gente ... confissão tem um gosto de desnudamento

Anônimo disse...

Tem gosto de contradição.
Tu tá diferente, hein?
Vou te dizer q este é o post mais verdadeiro e tenebroso de todos.
Não comentei pq estava completo e tinha motivos para estar.
Éééé..esse episódio te colocou em outro rumo.
Que bom.
Eu esperava que tu virasse o jogo, e agora, lendo os post mais atuais, nota-se que viraste.
Ótimo, querido.
Bola pra frente!