quinta-feira, março 23, 2006

Campos dourados

Eu não lido bem com a idéia de morte. Definitivamente isso me assusta. Não é fascinação, não é curiosidade é, sim, medo. E acho que acabo atraindo esse tipo de coisa. Sou daquelas pessoas que se o vivente estiver morrendo, eu chego perto, nem que seja para dar um oizinho, e ele vira morrente, na mesma hora. E o pior é que por mais que eu me afaste dela ela, a morte, parece que anda ao meu encalço. É a coisa que mais temo e parece ser a mais presente na minha vida. Tive muitas perdas familiares, não sei lidar com elas até hoje, mas agora eu cuido das minhas duas vós. Ou seja, é gente na fila que não acaba mais. Uma tem 69 e está vendendo saúde, minha irmã que o diga, a outra tem 83 e já vendeu tudo. Ainda tenho uma tia de 90 que só parece que vende, mas não entrega nada. No fim, fico eu sabendo que, mais cedo ou mais tarde, acabarei acordando e dando de cara com ela, a morte, em lençois de gente amada. Espero que seja eu recebido com um sorriso, que não sofram. Entretanto, fico me perguntando qual a diferença. Se sofrer talvez seja a última gota de vida que nos resta, então que soframos. Imediatamente lembro-me de ver parentes com câncer terminal disseminado. Não sofram, por favor. A morte, retiradas todas as lendas que dela contam, é nosso último momento de vida. Pois que seja assim então.
Sentir-se finito é sem dúvida sentir-se impotente. Saber que temos um tempo aqui é saber que não temos tempo para nada. Tudo o que nos insufla medo e o que acaba por formar a tal ética humana (se é que esse conceito existe) tem seu fundo no medo que temos dela, a tal da morte. Eu me sinto o maior medroso. Um dia, não respirar, não sentir, não ver, não ouvir ... não ... simplesmente não. Nada.
Teremos tido tempo? Teremos tido oportunidade? Teremos tido amor suficiente? Teremos tido dor suficiente?
Hoje eu vi a morte de pertinho, minha avó foi internada. Ela me deu um oizinho, a morte. Certamente isso é injusto. Ela sabe o dia que nos encontraremos, eu não. Espero que nesse último encontro às escuras, ela seja uma linda donzela loira que me convide para passear sobre o sol de uma tarde de primavera em lindos trigais dourados, cujo movimento segue o frescor do vento que se lança por sobre nós. Peço apenas dela um sorriso. O último. E, se não for pedir demais, gostaria, também, o mesmo sorriso de todos os que me virem embarcar para esse lugar.
No fundo não devemos temer o que não conhecemos, mas no fundo somos apenas humanos ... até um determinado dia.

Um comentário:

Anônimo disse...

É bom ter medo, assim acredito que tu não a procuras!